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Produtoras precisam de autorização para adaptar trabalhos acadêmicos?

Recentemente um amigo perguntou se uma produtora precisa pedir autorização para adaptar um trabalho de mestrado ou doutorado para uma obra audiovisual. Como de costume, a melhor resposta é “depende”.

 

Na maior parte dos casos, o que vai interessar as produtoras audiovisuais são aquelas narrativas de figuras e acontecimentos relevantes ou emblemáticas. Porém, os fatos em si não são protegidos pelas normas de Direitos Autorais. Assim, um pesquisador não poderia se opor à produção de filmes, séries e documentários inspirados nos acontecimentos narrados em seu trabalho, por mais inéditos que possam ser.

 

A Lei de Direitos Autorais brasileira (Lei n.º 9.610/98) prevê o seguinte: “no domínio das ciências, a proteção recairá sobre a forma literária ou artística, não abrangendo o seu conteúdo científico ou técnico, sem prejuízo dos direitos que protegem os demais campos da propriedade imaterial” (artigo 7º, § 3º).

 

Note-se, portanto, que o que a legislação protege é a “forma literária ou artística”, ou seja, em termos mais simples, a “maneira pela qual o pesquisador escreveu seu trabalho”. Isso significa que ninguém pode utilizar aquela “forma” sem sua prévia e expressa autorização. É por essa razão que se admite, por exemplo, o plágio de obras acadêmica. Citamos a seguir um exemplo desse reconhecimento no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

 

“DIREITO AUTORAL. Apelada que teve sua tese de doutorado plagiada pela apelante, em seu trabalho de conclusão de curso (TCC). Preliminares de nulidade afastadas. Justiça gratuita indeferida. Alegação de que houve mera citação de trechos do texto original, que não se sustenta, já que parágrafos inteiros do trabalho da apelada foram transcritos, sem que qualquer advertência sobre tratar-se de uma citação literal, ou mesmo referência à tese de doutorado fossem feitas. Modificação de algumas palavras, inversão de ordem de frases e quebra de parágrafos que não afastam essa conclusão. Plágio configurado. Arts. 46, III e VIII, 24 e 108 da Lei nº 9.610/98. Dano moral que é in re ipsa, dispensando prova. Plágio que afeta negativamente a idoneidade do trabalho original, o que é suficiente a configurar um dano extrapatrimonial ao verdadeiro autor. Apelada que é professora universitária em regime de dedicação exclusiva, o que revela a importância de sua produção acadêmica. Indenização fixada em R$ 25.000,00 que se mostra pertinente e não comporta redução. Sentença mantida. Recurso desprovido.” (TJSP, Processo n.º 0058639-14.2010.8.26.0114, Relator Des. Teixeira Leite, 28ª Câmara Extraordinária de Direito Privado, Data do julgamento: 07/06/2017)

 

E o caso das biografias? É possível criar um roteiro a partir de um livro, pesquisa ou trabalho biográfico? Esse é um caso bastante delicado pois envolve não apenas direitos autorais do escritor (ainda que os fatos em si sejam desprovidos de uma proteção normativa), mas também o direito de personalidade das pessoas representadas na obra. Vale frisar ainda que o trabalho pode conter obras/elementos específicos que recebem proteção autônoma como fotos, registros audiovisuais, marcas etc. Considerando os valores e riscos envolvidos em uma adaptação/inspiração, recomenda-se sempre que a produtora tenha cautela e realize a devida regularização de direitos conforme o caso.

 

Foto por Sam McGhee. In: Unsplash.

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