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Plágio e inspiração no YouTube: o que é protegido e o que não

Recentemente, o tema do plágio em vídeos no YouTube ganhou grande repercussão nas redes em razão de dois acontecimentos. No primeiro caso, o canadense Geoff Thew, dono do canal Mother’s Basement, acusou a brasileira Mariana Delveccio, dona do PenseGeek, de copiar seus vídeos sobre animes e cultura japonesa. Mariana chegou a negar o ocorrido, fazendo com que Geoff ficasse ainda mais irritado e publicasse um vídeo demonstrando os indícios do plágio. A youtuber acabou retirando todo seu conteúdo do ar e não tem mais publicado novos materiais. De modo semelhante, o estrangeiro Eric Kotzian acusou o brasileiro Mateus Hwang de plágio de seus covers no piano. Dessa vez, o rapaz se desculpou pela questão. [1]

 

Como não podia deixar de ser, tais acontecimentos geraram uma onda de comentários com as mais diversas opiniões sobre o assunto. Porém, nesse debate acalorado, pouco (ou nada) se falou sobre as questões jurídicas envolvendo o plágio do YouTube.

 

Nesse artigo, não queremos entrar em julgamentos éticos ou morais, mas tentar esclarecer alguns pontos importantes sobre o assunto, de acordo com a legislação brasileira.

 

Os conteúdos dos vídeos de YouTube são protegidos?

Nós podemos identificar ao menos 4 tipos de conteúdo em vídeos de YouTube que costumam ser protegidos:

  1. Roteiros, músicas, arranjos musicais, os vídeos em si e outras criações intelectuais dessa natureza: recebem proteção dos chamados direitos autorais. Esses direitos garantem duas tutelas importantes: (1) o direito exclusivo de usar, fruir e dispor da obra; (2) o direito de ter certos aspectos da personalidade do autor preservadas, por exemplo, o crédito pela autoria. Uma das consequências mais relevantes é que ninguém pode utilizar as obras de terceiro sem autorização – salvo algumas exceções bastante específicas.
  2. Atuação, interpretação e performance: são protegidos pelos chamados direitos conexos, com uma lógica parecida com os direitos autorais.
  3. Voz e imagem: são direitos de personalidade do indivíduo e, a princípio, não podem ser reproduzidos sem autorização.
  4. Formatos de programas: esse é um tema controverso. Se eu desenvolvo um novo tipo de programa de auditório, tenho proteção sobre esse formato? Existem posicionamentos e decisões judiciais nos dois sentidos. A proteção vai depender do caso a caso. É preciso analisar fatores como o grau de criatividade e identidade do formato, o investimento realizado pelo seu idealizador, entre outros.

 

Por outro lado, importante destacar que não há proteção para temas e ideias. Isso significa que mais de um YouTuber pode fazer vídeos sobre cachorros, jogos de videogame, receitas, unboxing, maquiagem, experiências etc. sem violar direitos de quem já fez isso antes.

 

Qualquer vídeo de YouTube tem proteção? Ou tem alguma condição?

No Brasil, existem alguns requisitos para reconhecer a proteção pelos direitos autorais:

  1. A obra intelectual tem que ser “estética” e “não técnica”;
  2. A obra precisa ser exteriorizada, ou seja, “sair da cabeça de seu criador”;
  3. A obra tem que ter algum grau de originalidade;
  4. A obra tem que ser fixada em algum suporte, tangível ou intangível. [2]

Vejam que o “registro” em órgãos públicos não é condição para a proteção pelos direitos autorais no Brasil.

 

O que é o plágio?

O plágio é o uso não autorizado de uma obra ou de trechos de uma obra com a tentativa de disfarçar esse aproveitamento, omitindo-se o crédito (a fonte) e colocando-se como o autor original do trabalho.

 

Como identificar o plágio?

A Lei de Direitos Autorais não fala qual o método para identificar quando há um plágio ou não. Assim, a doutrina costuma sugerir alguns testes para chegar a esta conclusão como: (a) houve acesso anterior à obra?; (b) houve tempo para produção da cópia?; (c) há repetição de erros?; (c) é uma cópia literal ou semelhante? (d) o que aproxima e o que diferencia as obras?; (e) o conteúdo em questão é protegido? [3]

 

Qual a diferença com a inspiração?

A inspiração é uma iluminação ou ideia que gera uma força criadora. A cada dia fica mais difícil dizer que existem criações totalmente originais ou inovadoras (ou será que não?). Todo mundo é influenciado pelos livros, músicas, filmes, pinturas, experiências e conhecimentos com os quais teve contato durante a vida. A inspiração tirada de outras obras e trabalhos em si não viola nenhum direito, desde que seu projeto/sua criação tenha um certo grau de originalidade. Na inspiração, portanto, não há simples cópia ou apropriação do que já existe.

 

O que pode acontecer com alguém que plagia um vídeo no YouTube?

Além das eventuais penalidades do próprio YouTube, a pessoa que realizou o plágio pode ser obrigada judicialmente a retirar o vídeo de circulação, dar publicidade ao ocorrido e indenizar o autor original.

 

Acho que meu vídeo foi plagiado, o que posso fazer?

Antes mesmo de se manifestar em redes sociais sobre o ocorrido, é aconselhável buscar uma assessoria jurídica especializada para orientá-lo(a) de modo técnico e imparcial. Uma falsa acusação de plágio também pode acabar gerando dever de indenizar contra o acusador, além de outras eventuais complicações.

 

[1] Cf. https://www.vice.com/pt_br/article/43b9xp/plagio-youtube-brasil

[2] Redação da Lei n.º 9.610/98: Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: […]

[3] Cf. Eduardo Lycurgo Leite. Plágio e Outros Estudos em Direito de Autor.

 

Foto por Rachit Tank. In: Unsplash.

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