O mercado de board games (jogos de tabuleiro) e card games (jogos de carta) está em franco crescimento, no Brasil e no mundo. Um bom indicador desse crescimento é o desempenho dos projetos dessa natureza em plataformas de financiamento coletivo (crowdfunding). O jogo Kingdom Death: Monster 1.5, por exemplo, levantou cerca de 12,4 milhões de dólares em sua campanha, bem acima de sua meta inicial de cem mil. A iniciativa, que está entre as mais bem-sucedidas da história, não é caso isolado. Podemos mencionar outros exemplos de sucesso como Exploding Kittens (8,8 milhões de dólares), The 7th Continent ($ 7), Dark Souls – The Board Game (3,8 milhões de libras) e Zombice: Green Horde (5 milhões de dólares).
Desse modo, é natural que muitos se entusiasmem a começar a desenvolver seus próprios jogos. No processo de criação, ainda que tenhamos um único idealizador original, é comum que outros colaboradores também participem. Estamos falando de ilustradores, designers, escritores e até programadores. Por vezes, até mesmo amigos podem contribuir criativamente com o jogo durante os testes e o desenvolvimento.
O que alguns desenvolvedores não sabem é que as contribuições criativas desses colaboradores podem ser protegidas pelas normas de direitos autorais e/ou propriedade industrial. O desenhista, por exemplo, tem o direito exclusivo de utilizar as suas ilustrações – ainda que sejam criadas para o projeto de outra pessoa. O que isso significa na prática? O Direito garante aos titulares dos direitos de propriedade intelectual o uso exclusivo sobre suas criações, obras e invenções. Isso significa que nenhum terceiro pode utilizar esses bens sem a prévia e expressa autorização. Do contrário, pode estar sujeito a indenizações, retirada do produto de circulação, dentre outras penalidades.
Assim, para realmente ser “dono” do jogo e de seu conteúdo, o idealizador/desenvolvedor deve regularizar todos os direitos de colaboradores que tenham participado criativamente no projeto. No Brasil, a cessão de direitos (autorais) deve ser sempre por escrito. Isso significa que a “mera” boa-fé das partes e a ciência de que uma obra foi criada para um projeto não implica necessariamente na transferência dos direitos. É preciso estabelecer um contrato prevendo essa cessão (ou licenciamento, se for o caso), com as possibilidades de uso, se haverá ou não pagamento, dentre outros detalhes.
Na prática, se o idealizador/desenvolvedor não assina estes documentos, está sujeito a um risco grande de indenizações e de retirada de seu produto de circulação. Por isso, é muito importante que o ímpeto criativo e empreendedor não esteja descolado das preocupações de viabilidade jurídica do projeto. “É andar uma casa para trás para avançar dez depois.” Aos poucos, traremos mais detalhes e questões importantes sobre esse assunto aqui no site.
Confira aqui a parte 2: Desenvolvendo jogos de tabuleiro e carta: quais conteúdos de terceiros posso usar?
Foto de Robert Coelho. In: Unsplash.