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Obra em domínio público: pode tudo?

Este ano, as obras de Monteiro Lobato entraram em domínio público. A despeito das recentes polêmicas, o autor é ainda considerado um marco da literatura infanto-juvenil – motivo pelo qual se espera que surjam diversas novas edições e versões de seu trabalho. A pergunta que vale ser feita nesse caso é: agora que os livros estão em domínio público, vale tudo? É possível utilizar as obras de Monteiro de qualquer jeito?

O domínio público é uma espécie de limitação temporal dos direitos patrimoniais de autor, ou seja, do direito exclusivo de usar, fruir e dispor da obra. Isso significa que, uma vez transcorrido certo prazo, qualquer um pode utilizar tais obras sem a prévia e expressa autorização dos titulares (ou herdeiros).

No Brasil, a regra geral do prazo de proteção dos direitos patrimoniais de autor é de 70 anos da morte do autor, contado do primeiro ano subsequente ao seu falecimento. Em obras audiovisuais e fotográficas, o prazo é de 70 anos a contar de sua publicação. Veja abaixo o texto da Lei de Direitos Autorais (Lei n.º 9.610/98):

Art. 41. Os direitos patrimoniais do autor perduram por setenta anos contados de 1° de janeiro do ano subseqüente ao de seu falecimento, obedecida a ordem sucessória da lei civil.

Parágrafo único. Aplica-se às obras póstumas o prazo de proteção a que alude o caput deste artigo.

Art. 42. Quando a obra literária, artística ou científica realizada em co-autoria for indivisível, o prazo previsto no artigo anterior será contado da morte do último dos co-autores sobreviventes.

Parágrafo único. Acrescer-se-ão aos dos sobreviventes os direitos do co-autor que falecer sem sucessores.

Art. 43. Será de setenta anos o prazo de proteção aos direitos patrimoniais sobre as obras anônimas ou pseudônimas, contado de 1° de janeiro do ano imediatamente posterior ao da primeira publicação.

Parágrafo único. Aplicar-se-á o disposto no art. 41 e seu parágrafo único, sempre que o autor se der a conhecer antes do termo do prazo previsto no caput deste artigo.

Art. 44. O prazo de proteção aos direitos patrimoniais sobre obras audiovisuais e fotográficas será de setenta anos, a contar de 1° de janeiro do ano subseqüente ao de sua divulgação.

Art. 45. Além das obras em relação às quais decorreu o prazo de proteção aos direitos patrimoniais, pertencem ao domínio público:

I – as de autores falecidos que não tenham deixado sucessores;

II – as de autor desconhecido, ressalvada a proteção legal aos conhecimentos étnicos e tradicionais.

 

Porém, parte dos chamados direitos morais de autor, que tutelam a relação personalíssima da obra com o seu criador, não se extinguem com o passar do tempo. Para este texto, nos interessam três direitos dessa categoria. Em primeiro lugar, os direitos de paternidade e de crédito, previstos no artigo 24, incisos I e II, da Lei, que garantem ao autor ser reconhecido e identificado como o criador da obra. Note-se, portanto, que ninguém poderá, por exemplo, publicar uma obra de Lobato chamando-a de sua, sob pena de violar os direitos morais de autor, mesmo se tal obra estiver em domínio público.

Em segundo lugar, devemos mencionar o direito “de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra” (artigo 24, inciso IV, Lei). Este garante a possibilidade de se opor a qualquer modificação da obra ou prática de atos que possa causar algum prejuízo ao autor. Logo, a preservação da reputação e honra do autor tornam-se limites à livre utilização da obra que está em domínio público.

De acordo com a Lei de Direitos Autorais, “compete ao Estado a defesa da integridade e autoria da obra caída em domínio público” (artigo 24, § 3º). A legislação não fala como seria essa defesa, motivo pelo qual podemos argumentar que o Poder Público poderia lançar mão de quaisquer instrumentos para atuar nesta defesa, inclusive, judiciais.

Dessa forma, os agentes culturais devem tomar cuidado no caso de aproveitamento e utilização de obras em domínio público. É preciso preservar os direitos morais de autor, sob pena de enfrentar indenizações, retirada de circulação da obra ou outros gravames e penalidades.

 

Foto: Museu Monteiro Lobato. In: Wikimedia Commons.

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