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As obras derivadas das obras audiovisuais

Os agentes que trabalham na área audiovisual já devem ter notado como as cláusulas de cessão ou licenciamento de direitos autorais são grandes e bastante detalhadas. Isso acontece porque a Lei n.º 9.610/98 prevê em seu artigo 4º o seguinte: “Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre os direitos autorais.” Em outras palavras, tudo que não está expressamente previsto no acordo, não pode ser “subentendido” ou “deduzido”.

 

Assim, as produtoras acabam fazendo previsões bastante detalhadas sobre as formas de uso e exploração da obra audiovisual e dos direitos cedidos para ter maior segurança de seu empreendimento. [Veremos em outro artigo se e quando esse grau de detalhamento é necessário]. Um dos tópicos mais relevantes nesse tipo de cláusula são as chamadas “obras derivadas”.

 

De acordo com a Lei de Direitos Autorais, obra derivada é aquela “que, constituindo criação intelectual nova, resulta da transformação de obra originária” (artigo 5º, inciso VIII, alínea “g”). A obra originária, por sua vez, é a “criação primígena”, ou seja, aquela que veio primeiro, que foi criada primeiro (artigo 5º, inciso VIII, alínea “f”). A obra derivada também recebe a proteção dos direitos autorais, assim como a originária

 

São exemplos tradicionais de obras derivadas: a adaptação de livros para roteiros cinematográficos, as traduções de obras para outras línguas, as adaptações infantis de livros, os arranjos musicais, entre outras. A própria obra audiovisual é derivada do roteiro. Mas podemos dizer que existem obras derivadas do filme, da série etc.?  Não há dúvidas que sim. O filme pode dar origem a peças de teatro, fotografias, quadrinhos, pinturas, jogos eletrônicos, etc. Porém, nem sempre é tão fácil identificar essa derivação.

 

Um dos pontos polêmicos diz respeito à novas obras audiovisuais que possas surgir em razão da primeira: trailers, versões estendidas, prequels, sequências, novas temporadas, minisséries, documentários, making of, redublagens, spin offs, transformação em animação, entre outras. Nesses casos, estamos tratando de obras derivadas?

 

Nas hipóteses em que há “mera” edição de trechos ou da íntegra da obra, não parece haver dúvida de que se trata de uma obra derivada. E quando há um razoável grau de criação no novo trabalho? Por exemplo, em uma nova temporada ou em uma sequência do filme?

 

Nos parece que as sequências, prequels, spin offs, novas temporadas e outros casos desse tipo serão obras derivadas de seus respectivos roteiros. Porém, tais roteiros, por sua vez, são também derivados das obras audiovisuais “originais” em si.  Em outras palavras, a produtora, na condição de titular dos direitos patrimoniais sobre o filme/série/etc., inclusive de seus elementos, é a única que pode autorizar a realização dessas obras audiovisuais derivadas.

 

Retomando a constatação de nosso primeiro parágrafo, poderíamos perguntar: então é suficiente que a produtora preveja em seus contratos a possibilidade de realização de obras derivadas ou é preciso detalhar bastante? Defendemos que, no caso dos contratos de produção audiovisual, a boa-fé contratual e os costumes e práticas de mercado induzem ao entendimento de que uma cláusula “genérica” compreendendo as “obras derivadas” já seriam adequadas para novas temporadas, sequências e assim por diante. A produtora, evidentemente, deseja obter retorno efetivo de seus investimentos e isso se dá também pela exploração das obras derivadas. Porém, tendo-se em vista o disposto no artigo 4º e as peculiaridades da disciplina de direito autoral, caso a produtora preze pela segurança jurídica (ao invés de uma facilitação de negociações, agilidade de produção e outras questões estratégicas), deverá firmar contratos mais detalhados, prevendo cada uma dessas modalidades de obras derivadas.

 

Foto por Jakob Owens. Disponível em Unsplash.

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