Recentemente, viralizou um vídeo da estudante Ana Julia Pires Ribeiro, de 16 anos, na Assembleia Legislativa do Paraná. Em trecho de seu discurso, em que ela defende as ocupações das escolas públicas pelos secundaristas em todo o Brasil, Ana Julia diz que o movimento estudantil levou aos estudantes mais conhecimento de política e cidadania do que todo o tempo que estiveram sentados e enfileirados em aulas-padrão.
Seu discurso forte e emotivo foi classificado pela revista Forbes como o futuro da juventude do Brasil. Mas não é necessário buscar um olhar externo para entender o que está ocorrendo e o que significam as ocupações das escolas pelos secundaristas.
Recentemente, foi lançado o relatório “Nossa Escola em (Re)Construção”, resultado da pesquisa realizada pelo programa Porvir, do Instituto Inspirare, que ouviu mais de 132 mil jovens de 13 a 21 anos de todo o Brasil para entender: o que eles pensam da escola e como eles gostariam que ela fosse?
As conclusões apresentadas pelo relatório nos mostram que o discurso de Ana Julia não se encontra isolado, tampouco se limita à opinião dos estudantes que têm ocupado suas escolas. Sua fala é expressão de um sentimento, compartilhado por milhares de jovens de todo o Brasil sobre os problemas da educação atual e a escola que eles querem ter.
Os estudantes, ao mesmo tempo em que são muito críticos às aulas, à estrutura física e à relação existente entre os integrantes da comunidade escolar, demonstram forte vínculo afetivo com suas escolas ao dizer que, apesar de todos os problemas, eles gostam de estudar nelas. Isso ajuda a explicar a mobilização dos estudantes durante as ocupações das escolas para cuidar daquele espaço público, limpando e até reparando problemas que não eram solucionados há tempos.
Um dos pontos mais criticados pelos estudantes com relação à escola atual é que eles não participam da tomada de decisões da escola, sendo que a maioria deles considera que a participação direta dos estudantes é imprescindível para a escola que eles gostariam de estudar. Os estudantes se importam com a escola, se interessam pela educação que recebem e querem ser ouvidos quando as decisões governamentais os afetam diretamente.
A pesquisa também mostra que os estudantes estão ávidos por atividades que extrapolem os muros da escola, que possibilitem a interação com a comunidade e que superem o modelo tradicional de aula expositiva, oferecendo uma formação mais abrangente. Os estudantes querem aprender por meio de atividades mais práticas e interativas e que se utilizem mais da tecnologia.
Embora reconheçam o valor das disciplinas tradicionais, como matemática, e a importância de se preparar para o vestibular e para o mercado de trabalho, eles também querem “atividades educativas que os ajudem a ter melhores relações humanas e sociais e a entender sobre política, cidadania e direitos humanos”, o que é – na visão deles – essencial para se garantir o respeito à individualidade de todos.
Esse ponto específico me fez lembrar de uma crítica feita pelo Mario Sergio Cortella sobre o afastamento das pessoas, e também dos jovens, da política. Ele dizia que era necessário que as pessoas percebessem que a participação na vida pública não anula o indivíduo. Pelo contrário, é na participação na sociedade, na responsabilização pelos assuntos de interesse público, ou seja, na política, que o indivíduo se destaca.
Os jovens secundaristas aprenderam isso participando e fazendo política com as próprias mãos. Agora, convencidos de que eles podem ter voz ativa na definição das políticas públicas e que eles podem lutar pela construção da escola que querem estudar, será difícil persuadi-los do contrário (boa sorte para aqueles que acreditam que adolescente pode ser facilmente utilizado como massa de manobra e que não tem convicções pessoais e ideais próprios).
Postado originalmente em: http://penaescola.com/2016/11/01/a-voz-dos-secundaristas/
Photo by Midia Ninja. In: Photopin.